A novela do Edifício ITU, o primeiro de grande porte construído em Campos, continua rendendo capítulos que afastam o desfecho final. O Manchete RJ teve acesso à decisão judicial de agosto deste ano, que determinou a demolição do prédio. Mas, quase três meses depois, ainda não há sinais de início dos trabalhos, e a multa estipulada pela Justiça já ultrapassa R$ 1,5 milhão.
Quem passa pelo cruzamento das ruas Treze de Maio e Siqueira Campos percebe que algumas lojas do térreo seguem funcionando, mesmo após a Defesa Civil informar que foi intimada a promover a interdição do imóvel e notificar os ocupantes acerca da decisão judicial. A equipe do Manchete RJ esteve no local, conversou com um comerciante que trabalha ali há 30 anos – e disse não ter medo de o edifício cair. Também foi possível constatar que alguns estabelecimentos já estão sendo desocupados.
Contexto histórico do processo
- Para entender a situação atual, é importante compreender o contexto. O processo envolvendo o Edifício ITU cita duas empresas como responsáveis: a Ampla (atual Enel) e a ITU, Incorporadora de Terrenos Urbanos Ltda. Há anos, ambas foram condenadas a apresentar um plano de restauração do edifício – o que não ocorreu.
- Em 2005, o Ministério Público moveu uma ação para obrigar as empresas a recuperar o prédio, que estaria em situação estrutural grave.
- O MP se baseou em um laudo técnico produzido no Inquérito Civil. Segundo a decisão, o laudo foi elaborado por engenheiros do Coppam e complementado pela Anfea em 2007, concluindo que o edifício oferecia “riscos de natureza grave à integridade física e patrimonial da comunidade vizinha, mas poderia ser aproveitado se fossem adotadas urgentemente obras de recuperação”.
- Posteriormente, no curso do processo, a Ampla apresentou um laudo de engenharia indicando risco de desabamento e afirmou que a recuperação seria inviável. A ITU se opôs à demolição e sustentou que a estrutura poderia ser recuperada.

Audiência de 2005
Em maio de 2005, uma audiência registrou os seguintes pontos:
- A Ampla reiterou a necessidade de demolição;
- A ITU manteve a oposição, alegando viabilidade técnica de reparação;
- O MP pediu que a Defesa Civil avaliasse a viabilidade da recuperação, indicando se a demolição seria a única solução possível;
- A Defesa Civil informou não possuir equipe técnica para elaborar tal laudo;
- O Município declarou não se opor a eventual acordo pela demolição;
- Diante disso, o MP solicitou prazo para que a ITU apresentasse um projeto de recuperação.
Decisão da juíza
Até que em agosto deste ano, a Justiça destacou que a ITU nunca apresentou o projeto de recuperação, alegando falta de recursos financeiros — fato confirmado à reportagem pela própria empresa.
Com isso, a decisão considerou que a ITU, a única parte que não queria à demolição, não cumpriu sua obrigação, e a juíza determinou a demolição, lembrando que o processo tramita há 20 anos e que o prédio sempre apresentou risco real de desabamento, sem solução efetiva.

Multa superior a R$ 1,5 milhão
A Justiça determinou que ambas as empresas seriam responsáveis por custear a demolição, fixando um prazo de 30 dias para o início dos trabalhos, sob multa diária de R$ 30 mil em caso de descumprimento. O prazo venceu em setembro deste ano e, até agora, não há sinais de demolição.
O que diz a ITU?
Questionada pelo Manchete RJ, a ITU afirmou que não iniciou os trabalhos porque entrou com um recurso, acatando a decisão, mas destacando alguns pontos. A empresa diz que, ao contrário da Ampla, possui lojas alugadas no térreo e seria a única proprietária a sofrer prejuízo patrimonial com a demolição.
No recurso, a ITU apresentou cálculos afirmando que seus imóveis no prédio valeriam cerca de R$ 33,6 milhões, enquanto a demolição custaria no máximo R$ 3 milhões, sustentando que a Ampla deveria ser obrigada a arcar com a maior parte do valor.
Por fim, a Incorporadora alega que a Ampla deveria depositar imediatamente a diferença entre o valor estimado de seus imóveis e o custo da demolição — aproximadamente R$ 30 milhões — para compensar seu prejuízo.
A ITU também ressalta que, além dela e da Ampla, existem imóveis no térreo que pertencem a outros proprietários pedindo, inclusive, que não sejam causados danos a essas referidas propriedades e que a demolição seja limitada do 2º pavimento para cima. A juíza ainda não respondeu os embargos.
O Ministério Público se manifestou nesta segunda-feira (17) de forma contrária ao recurso enviado pela ITU e pediu que se os embargos forem analisados, que sejam rejeitados. Segundo o MP, a Incorporadora está apenas expressando insatisfação com a decisão, o que deveria ser discutido por outro tipo de recurso.
O que diz a Enel?
O Manchete RJ também entrou em contato com a Enel, antiga Ampla. Em nota, a empresa afirmou que está cumprindo a decisão judicial desde que foi intimada:
“A Enel Distribuição Rio informa que está cumprindo a decisão judicial que determinou a demolição do prédio da Rua Treze de Maio, 150, em Campos dos Goytacazes. A distribuidora esclarece que, tão logo foi intimada, iniciou as tratativas com os órgãos municipais para cumprimento da decisão.”
O advogado Ademir Martins, especialista em Direito Imobiliário, foi consultado pelo Manchete RJ e informou que o imóvel em questão está constituído na forma de propriedade em condomínio, o que torna solidaria a responsabilidade na preservação ou demolição do bem.
“A toda evidencia trata-se de condomínio edilício, que pela lei a propriedade é constituída em frações do terreno, isso implica que todos os co-proprietários são responsáveis pela manutenção e pela demolição de forma solidaria se assim for o entendimento das autoridades. Acredito que eventual discussão sobre o grau de responsabilidade de cada co-proprietário será discutido em ação própria manejada por estes, justamente, postulando direito de regresso caso alguém se sinta prejudicado em decorrência de ter arcado com os custos da demolição”.









